Saiba como emitir o certificado da 7.ª edição do Curso

Todos os certificados da 7.ª edição do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS: CAPACITAÇÃO PARA CONSELHEIROS E LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS já foram emitidos e estão disponíveis no Sistema para Emissão de Certificados, para isso basta ter o número do seu CPF.
Nossa equipe produziu dois tutoriais com o passo a passo para imprimir e salvar o certificado.

Para imprimi-lo, acesse aqui.

Para salvá-lo, acesse aqui.

No certificado de extensão universitária emitido pela Universidade Federal de Santa Catarina, constará a duração do Curso e carga horária de 120 horas.
Em caso de dúvidas referentes à certificação, envie uma mensagem através da aba “Contato” do site do Curso.

Certificados já estão disponíveis para impressão

Os certificados da 7.ª edição do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS: CAPACITAÇÃO PARA CONSELHEIROS E LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS já estão disponíveis para download.

O Curso foi oferecido na modalidade de ensino a distância para 41.466 cursistas de todo o Brasil, em uma promoção da Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas do Ministério da Justiça (SENAD-MJ) em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), por meio do Núcleo Multiprojetos de Tecnologia Educacional (NUTE). As atividades encerraram no dia 4 de janeiro de 2016, após a prorrogação de 28 dias que visou favorecer os cursistas que sofreram danos em decorrência do rompimento da barragem de Fundão, em Minas Gerais.

Mais de 10 mil cursistas cumpriram todas as etapas exigidas para certificação. Esses concluintes podem acessar o Sistema para Emissão de Certificados e imprimir o certificado de extensão universitária, emitido pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Para isso, basta acessar a plataforma e inserir o número do seu CPF.

Em caso de dúvidas referentes à certificação, envie uma mensagem através da aba “Contato” do site do Curso.

A coordenação e toda a equipe da 7.ª edição do Curso agradecem a participação de todos.

Material didático já está disponível no AVEA

A 7ª edição do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS: CAPACITAÇÃO PARA CONSELHEIROS E LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS finalizou, no dia 4 de janeiro, as atividades para os cursistas que foram afetados pelo rompimento da barragem em Minas Gerais.

Os cursistas concluintes, que cumpriram as etapas exigidas para certificação, poderão acessar o certificado de extensão universitária, emitido pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a partir de 18 de janeiro.

Com o fim das atividades, os conteúdos dos módulos, vídeos e materiais complementares desta edição do Curso  permanecerão disponíveis no site, na aba AVEA, não só para os cursistas mas também para todas as pessoas interessadas no assunto.

Oferecido na modalidade de educação a distância, gratuito, com carga horária de 120 horas e duração de 2 meses, o Curso foi desenvolvido pelo Núcleo Multiprojetos de Tecnologia Educacional da Universidade Federal de Santa Catarina (NUTE-UFSC) e promovido pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça (SENAD-MJ).

Certificado

Prezado(a) cursista,

Em decorrência dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, no dia 5 de novembro, na unidade industrial de Germano, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto, a coordenação do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS prorrogou o Curso, até o dia 04/01/2016, para cerca de 300 cursistas que foram afetados pelo rompimento da barragem. Em virtude dessa prorrogação, foi necessário alterar também a data de certificação do Curso para 18/01/2016.  A partir desta data, os certificados estarão disponíveis de forma on-line no site http://www.certificado.prpe.ufsc.br/.

Agradecemos, desde já, a sua compreensão.

Cordialmente,

Coordenação do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS.

Entrevista com Gabriel Amado, apoiador do Movimento Nacional da População de Rua

O Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) se constitui como um movimento de luta e reivindicação dos direitos da população em situação de rua. Gabriel Amado, psicólogo e apoiador do movimento, nos conta em entrevista sobre a importância do movimento, suas ações de luta e a relação dessa população com o uso de drogas.
Falando também sobre a população de rua e uso de drogas, o documentário “Consultório na Rua – a rua não é um mundo fora do nosso mundo”, realizado pelo Departamento de Atenção Básica (DAB/SAS/MS), apresenta e discute a experiência dos Consultórios na Rua, nos municípios de São Paulo e Rio de Janeiro, em junho de 2013. O vídeo mostra também o caminho percorrido por cinco equipes em seus desafios diários para possibilitarem o acesso, criarem vínculo e superarem as dificuldades que o cuidado a essa população exige.

Como você vê a importância da organização do Movimento Nacional de População de Rua a partir da sua visão como psicólogo, que está dentro e fora do movimento?
Então, eu vejo como uma evolução política muito grande com relação à representatividade dessa população, para quem a gente está muito acostumado a fazer política, principalmente nós, profissionais, que acabamos tendo uma distância dessa vivência, dessa realidade. Então, essa organização, o protagonismo da população de rua, de eles mesmo estarem ocupando esses espaços de construção política, eu vejo como um enorme avanço da política. Dessa possibilidade de dialogar com quem realmente sofre a opressão. Existe um distanciamento nosso, institucional, com a população de rua e às vezes não permite essa aproximação. Só que hoje o protagonismo está tão forte que existe uma disposição da população de rua de estar discutindo quando o assunto são eles. Existe um lema que a população de rua segue muito, que é “nada sobre nós sem nós”. Então, eu vejo de suma importância essa organização de estarem lutando por serem reconhecidos como sujeitos de direito. Eu vejo que eles já pularam até uma etapa de visibilidade. Primeiro, de serem reconhecidos como seres humanos, e agora mais ainda: “somos sujeitos de direito”. Como assim a população de rua como sujeitos de direito? Então eles vêm pra dar um tapa na nossa cara, eles têm que ter saúde e educação como todos nós, no princípio da universalidade. Então, eles estão ali, sim, para fazer valer os direitos constitucionais. Eu vejo essa organização deles como superimportante, principalmente no viés da representatividade.

Como eles estão se organizando em nível nacional?
Existe um movimento nacional da população em situação de rua, uma articulação em que eles têm cadeiras centrais em políticas de conselhos nacionais, que existem por estados. Hoje, já existe uma grande discussão de uma autonomia por estado, porque existe uma centralização na organização nacional de população de rua, que tem o contato direto com a presidência, com as políticas mais do centro do país que são importantes. Hoje a gente fica muito preso a diretrizes que vêm mais do centro do país. Então, hoje já está sendo discutida uma autonomia dentro dos estados que não dependa muito dessa centralidade, mas que já há na maioria dos estados esse movimento. Claro que a maioria dos estados tem suas peculiaridades dentro do movimento, cada um tem o seu processo. A gente sabe que dentro dos estados há segmentos religiosos mais voltados ao campo assistencialista, mas, ainda assim, o processo que a população de rua, que o movimento está conquistando, é um processo de direito, é um processo de conquista daquilo que é pra ficar. Então eu vejo que cada estado tem a sua peculiaridade de organização, mas todos estão nessa evolução na luta por direitos. Eu vejo que existe essa relação muito forte com a organização nacional de população de rua, que é importante, só que hoje se luta mais pela autonomia dos estados.

Quais são as ações que o movimento de população de rua realizam atualmente?
A gente vem lutando dentro de vários setores, tanto da assistência quanto da segurança pública, da saúde. Vamos pegar o exemplo de Florianópolis. No início do ano, a Polícia Militar, que estava fazendo uma abordagem bem forte com a população de rua, numa violência… O que a gente fez? A gente convocou o coronel, o comandante da PM, para desenvolver esse processo de sensibilização, para perguntar o que estava acontecendo, e também falar da população de rua, colocando a população de rua como pauta dentro desses espaços. Foi quando conseguimos fazer uma reunião na Câmara de Vereadores de Florianópolis, junto com o coronel Araújo. Posterior a isso, não digo que melhorou, porque a própria PM, com a militarização da polícia, não consegue que ela afrouxe tanto, mas diminuíram um pouco as abordagens arbitrárias, mais agressivas por parte da PM. O que aconteceu foi que a Guarda Municipal meio que assumiu esse papel da repressão. Então, junto com a Defensoria Pública, estamos encaminhando uma série de documentos de denúncia da galera da rua, que está recebendo umas abordagens bem violentas por parte da ROMU, aquela Ronda Ostensiva, que é tipo um BOPE da Guarda Municipal. Estamos nos aproximando mais da Guarda, no intuito de fazer essas denúncias, porque está ocorrendo muita violência na rua.
Nos espaços da saúde, principalmente no campo da saúde mental, que é bem defasado em Florianópolis, tem o Consultório na Rua, que é defasado, a equipe é defasada. A própria equipe, às vezes, não gosta de trabalhar com população de rua. Então aquela abordagem fica pior ainda, na aproximação com a rua, o vínculo é primordial. No momento em que estão defasados esses espaços, abre campo para a lógica manicomial. Então, ao invés de acessar a rede comunitária, a rede que está perto da comunidade, acaba sendo utilizada a lógica de internação, que não tem resultado efetivo algum. Hoje, em Florianópolis, existe uma ação muito forte dos centros manicomiais, que são as comunidades terapêuticas. São os atuais manicômios que acabam não tendo uma conexão com a Rede. Isso acaba complicando, às vezes a gente deposita uma expectativa, mas as pessoas acabam não conseguindo fazer uma ideal vinculação num processo de recuperação autônoma. Hoje estamos lutando, estamos com várias reuniões, porque nós estamos com um projeto de fortalecimento dos dispositivos da saúde mental dos territórios, o próprio CAPES AD 24h, que está sendo prometido há mais de três anos em Florianópolis. Estamos fazendo pressão para saírem esses dispositivos. No momento que sair um CAPES AD 24h, já está comprovado que diminui drasticamente as internações. Então, a gente varia os tensionamentos, o papel do movimento é tensionar as políticas para fazer o básico. E o que é o básico? É fazer valer a constituição. O nosso papel é dar visibilidade para uma população tradicionalmente invisível na sociedade.

Como você vê o uso de drogas na população em situação de rua?
O uso de drogas da população de rua às vezes acaba sendo um pouco mais prejudicial, justamente pela droga ocupar um campo muito forte de prazer, devido à falta de outros prazeres. Quando a droga supre os espaços do Estado, da família, a pessoa acaba tendo uma relação mais prejudicial com a droga. A gente não vê em nenhum momento a droga como o problema; muito pelo contrário, às vezes ela é a única fonte de prazer na rua. Existe uma estigmatização muito grande da população em situação de rua em relação ao uso de drogas. Nesse viés do uso prejudicial, parece que todo mundo da rua acaba tendo uma roupagem de drogado. Até porque essa palavra, drogado, já é estigmatizadora. O uso de drogas existe, e ele fica mais precarizado, numa relação mais prejudicial, porque as relações de lazer e prazer são muito curtas, então tu não consegue gerar muita autonomia, porque você também não tem muita coisa pra te depender também. O próprio [Roberto] Tykanori, atual gestor da coordenação da saúde mental do Ministério da Saúde, tem uma frase que é muito importante nesse campo da saúde mental: “quanto mais dependente nós formos de muitas coisas, mais autônomos nós somos”. Essa dependência não é no campo da substância, é se relacionar com a cultura, com esporte, edução, moradia. É essa ampliação de dependência, de lazer, de prazer, que a gente se propõe para estar lutando com a população de rua, para que eles não fiquem necessitando de um prazer único com a droga, que lhes causa prejuízo. A população de rua vem de uma exclusão da família, da sociedade, e acaba enxergando na droga um campo muito forte de prazer que acaba gerando uma relação prejudicial. Assim todos nós, se a gente depender de uma coisa só para ganhar prazer, vai se tornar prejudicial também, pode ser a droga, pode ser a internet, enfim, pode ser qualquer coisa. A rua, por ter uma precarização, de exclusão, de não ter muitas opções de prazer, ela, sim, acaba tendo uma relação um pouco mais prejudicial com algumas drogas. Mas isso não ocorre com todo mundo. As pesquisas já estão mostrando que é uma parcela de 30 a 35%, no máximo, que é uma parcela muito igual ao resto da população, que tem uma relação de prejuízo com a droga. Só que, como existe uma estigmatização, um preconceito com a população de rua, acabam taxando todos como ladrões, como usuários prejudiciais, perigosos.

O movimento de população de rua faz alguma ação específica com relação ao uso de drogas?
Isso que estamos nos propondo agora. Estamos com um projeto para atuar dentro dos centros POP de redução de danos. A gente vem se preocupando com essa questão, no momento que a gente faz a reunião com a saúde, buscando o fortalecimento dessas ferramentas, desses dispositivos de saúde mental. É justamente isso que a gente quer, a gente quer estar sendo visto com outro olhar, com o olhar de cuidado. Hoje a gente anda com uma preocupação sim, porque os próprios espaços de internação, as fazendas terapêuticas, têm sido bem complicados, tem algumas fazendas que acabam escravizando as pessoas lá dentro, não dando autonomia, colocando à força que eles rezem; a cura fica muito atrelada àsalvação religiosa. A gente vem se preocupando com isso, e lutando pelo fortalecimento dos dispositivos de saúde mental públicos. Estamos atuando dessa maneira muito forte e nos colocando à disposição para construir, dentro dos dispositivos da assistência, um espaço para conversar sobre drogas, que é esse projeto que estamos para fazer nessa área de redução de danos que vamos apresentar agora para o município de São José – SC.

Há relações entre racismo e uso de drogas? Eduardo Ribeiro responde

No dia 20 de novembro se comemora o Dia da Consciência Negra no Brasil, uma data importante para refletirmos como a guerra às drogas alimenta o racismo no Brasil e no mundo. Uma pesquisa feita nos Estados Unidos evidencia que  brancos e negros praticam a venda e o uso de drogas, porém negros têm cerca de 2,6 mais chances de serem presos por crimes relacionados ao tráfico.

Para falar sobre isso, entrevistamos o professor da Rede Pública Eduardo Ribeiro, Coordenador da Iniciativa Negra Por Uma Nova Política sobre Drogas e membro da Rede Latino-Americana de Pessoas que Usam Drogas, que nos conta que a guerra às drogas sempre foi uma guerra contra pessoas.

Qual a importância do dia da consciência negra?

O dia 20 de novembro é um marco importante não apenas para demarcarmos a importância da luta negra contra a escravidão. É outro de tantos momentos para reapresentarmos a centralidade da luta pela superação do racismo, elemento estruturador das relações políticas, econômicas, sociais e culturais no Brasil. É um momento de visibilidade da contribuição negra para a construção do Brasil a partir do signo da luta, e também um espaço em disputa, onde diversas narrativas pronunciam o protagonismo negro no entendimento do momento atual do país. O 20 de novembro são as mulheres pretas em marcha, e é como sempre estiveram. São jovens empretecendo e encrespando as ruas. É mais um motivo para a celebração das nossas memórias, renovação das nossas esperanças e alimento das nossas batalhas.

Você considera que há alguma relação entre racismo e uso de drogas?

Conseguir vincular a pauta da política sobre drogas com a pauta da juventude negra é poder dar nome às mortes que vêm sendo contabilizadas ao longo dos anos e que são legitimadas pela ideia de que existe uma guerra às drogas; a história do proibicionismo nos demonstra que a guerra às drogas sempre foi uma guerra às pessoas: ela criminaliza a pobreza e encarcera a juventude negra.

A permanência constante na história brasileira de um estereótipo racializado na construção dos “suspeitos”, levantados pela ideia das classes perigosas no início do século passado, e que organiza o saber-fazer policial, está também conformada de forma estrutural no sistema judiciário brasileiro. Aqui, a seletividade do sistema penal desdobra-se sobre um ideal punitivista que focaliza alguns segmentos sociais e tipos de delito, sobretudo os crimes contra o patrimônio e o tráfico de drogas, e se dedica ao aprisionamento e execução da população negra. Observemos a persistência de mazelas históricas no sistema prisional e a reprodução constante de desigualdades no campo da justiça criminal, pois esse modelo é parte de um projeto político das elites, e não é acessório: é estruturante.

Quais são as saídas possíveis para a inegável violência e o encarceramento da juventude negra no Brasil?

É fundamental pensarmos medidas de desencarceramento. A proteção das mulheres encarceradas, mães, gestantes sobretudo, é urgente, necessário, e o serviço ofertado é desumanizante, degradante. A urgência em determinarmos um marco legal para substâncias tornadas ilícitas não pode vir desacompanhada de medidas que combatam o racismo institucional, que estrutura o nosso modelo de segurança pública e o judiciário. É fundamental aliarmos a proteção à vida ao um modelo de promoção de acesso a direitos para a nossa juventude negra. Desmilitarizar a polícia e estruturamos um modelo de segurança pública que oferte a proteção, e não a guerra, como saída é fundamental. E também é preciso encontrar mecanismos de acolhimento ao uso abusivo das substâncias, baseados no respeito aos direitos humanos, à autonomia e à promoção de cidadania.

Redução de danos

“A redução de danos pode ser considerada a principal estratégia de cuidado a usuários de drogas utilizada, hoje, no campo da Saúde Pública”, destaca a assistente social e psicóloga Patrícia Maia von Flach. No texto a seguir, a professora Patrícia, que também é consultora técnico-científica da 7ª edição do Curso, explica o que é redução de danos e conta um breve histórico da sua ação no Brasil.    

“Redução de danos é um conjunto de políticas e práticas cujo objetivo é reduzir os danos associados ao uso de drogas psicoativas em pessoas que não podem ou não querem parar de usar drogas. Por definição, a redução de danos foca na prevenção aos danos, ao invés da prevenção do uso de drogas, intervindo com pessoas que seguem usando drogas. São práticas em saúde que consideram a singularidade dos sujeitos, que valorizam sua autonomia e que constroem com o usuário projetos de vida que priorizem sua qualidade de vida. Manter as pessoas que usam drogas vivas e protegidas de danos irreparáveis são consideradas prioridades.

No Brasil, ações de redução de danos começaram em 1989, no município de Santos, SP, por meio da iniciativa inédita de realizar a troca de seringas entre usuários de drogas injetáveis (UDI), suspensa posteriormente por decisão judicial. O primeiro programa de redução de danos  a trocar seringas no Brasil surgiu em Salvador, BA, no Observatório Baiano sobre Substâncias Psicoativas (CETAD Observa), em 1995. Depois deste, diversos programas e projetos de redução de danos são implantados em estados brasileiros, consolidando-se como uma estratégia de atenção aos usuários de drogas.

Em 1998 é sancionada, no estado de São Paulo, a primeira lei estadual que legaliza a troca de seringas. Seis anos depois, a Redução de Danos passa a ser vislumbrada como uma estratégia na Política de Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas, quando lançada pelo Ministério da Saúde, em 2004.

O redutor de danos é o profissional que trabalha no campo da redução de danos. Para tanto, deve aceitar as pessoas como elas são, evitando julgar comportamentos, opondo-se firmemente à estigmatização de pessoas que usam drogas. De início, os redutores de danos eram pessoas que usavam drogas ou pessoas próximas e familiarizadas com o universo do uso, abertas à linguagem e às dimensões e cultura dessa realidade. Atualmente, qualquer pessoa, trabalhador ou cidadão tem sua participação no sentido de protagonizar a redução de danos nas práticas intersetoriais de promoção da vida das pessoas que usam drogas e de sua rede social e afetiva.

Abaixo segue a entrevista, realizada pelo CETAD Observa, no dia 9 de novembro de 2015, com o redutor de danos Anselmo Luiz Santana Santos, de 52 anos. Quem o entrevista é Renata Pimentel, psicóloga e membro técnico do CETAD Observa.

Você conheceu a redução de danos como?

No CAPS. Eu vi uma redução de danos acontecer em mim. Eu vi aquilo acontecer. No CAPS eu eduquei o meu uso. Eu já uso a droga sem prejudicar minha vida. Eu tenho minha vida profissional, familiar. Eu não tenho mais problema com o uso de drogas. O Gessé foi o meu redutor de danos. Aí eu aprendi muito com ele. Com aquela paciência toda.

Minha militância começou quando eu tive um curso no CETAD mesmo e fui convidado pra fazer um curso, que eu já tava naquela fase de ter alta e tudo. Aí a AMEA (Associação de Usuários e Familiares dos Serviços de Saúde Mental do Estado da Bahia) me chamou pra fazer o curso de Cidadania e Direito das pessoas que têm transtorno mental. Eu fiz esse curso.

Aí de repente nesse curso rolou a Declaração dos Direitos Humanos. Aí eu descobri que até a gente tinha direito de fazer uma associação. De ter uma associação. Aí eu pensei: pô cara!, eu já sofri tanta coisa, passei tanta coisa por ser usuário de drogas. Aí já fui pro CAPS de novo, quando eu saí daqui do curso. Já fui juntando a galera e a gente começou a fazer reunião de usuários de drogas. E o lema da gente era: “Um cuidar do outro”.

O que é redução de danos?

Pra mim, redução de danos, antes, tinha as trocas de seringas e tal. Antigamente tinha mais usuário UDI (Usuário de Drogas Injetáveis). […] Hoje, eu comecei a estudar. Comecei a estudar os efeitos. Coisa que eu não sabia. Eu era usuário, mas não sabia os efeitos que as drogas faziam em mim.

E você acha que saber os efeitos das drogas fez com que você usasse de uma forma diferente?

Sim. […] Se eu vejo que estou em um uso assim, passando daquilo que eu propus pra meu uso, eu começo a procurar estratégias […] Estratégias pra que eu volte aquilo de não ter mais o uso abusivo.

Estratégias como?

Estratégias como me dedicar a outras coisas […] Agora eu percebo mais que eu tenho outras maneiras de resolver algum problema, tanto sentimental ou que seja outro, sem que tenha uma droga ali. Então, tanto que eu vou resolver minhas coisas agora de cara. Se tiver de usar, uso depois…  A droga em minha vida teve o significado de aliviar um pouco o meu sofrimento. É por isso que eu acho que tem que legalizar mesmo. Talvez, assim, legalizando vai ter imposto. Aí o imposto seria destinado para o tratamento dos usuários.

O que faz um redutor de danos?

Olha, não é um policial que vai na boca, nem um psicólogo. O redutor de danos tem que ir lá. Com relação aos moradores de rua, é chegar assim e dizer “Pô, cara!, você tem direito de ficar na rua se você quiser, você não é obrigado a sair da rua, mas contanto que você saiba os seus direitos e viva na rua sem causar danos a você. A mesma coisa é o uso. Se a pessoa está ali usando em uma lata enferrujada, a função do redutor de danos é chegar ali e falar os riscos dela estar usando o crack naquela lata. Se a pessoa está usando no dinheiro, a gente tem que estar ali, no local do uso, e falar para aquela pessoa que o dinheiro tem muitas bactérias. Eu já usei muitas drogas, hoje eu sei, então eu posso passar tudo isso para que no uso deles eles tenham o mínimo de danos. Não é comparar, é que a dor que ele sente, a discriminação, o preconceito, tudo isso eu já passei. É o papel do redutor de danos alcançar os mais vulneráveis mesmo. Outra coisa, também, é você levar um usuário pro hospital. Talvez pelo uso da droga ele não tem a capacidade de ir lá procurar um médico. A gente tem que fazer esse papel porque, às vezes, se a gente não for com o cara lá, ele não vai se cuidar. Agora, eu trabalho muito na expectativa de vida da pessoa, de dizer pra ele que ele pode! Então o redutor de danos tem que ter esse sentimento também, de ver ali a pessoa no risco […] E chegar lá e querer, sentir no coração, que aquilo ali não tá certo. Que precisa mudar.

O que você pretende, enquanto redutor de danos, desenvolver nessas pessoas?

O que eu espero que ela alcance é a autonomia, a expectativa de vida, o conhecimento das leis dos usuários… Eu acho que eu posso fazer o que fizeram comigo. Se você for ver a minha vida antigamente, eu era um nada; um lixo. Hoje em dia eu continuo sendo um usuário de drogas, mas minha vida mudou. A droga não é ruim, às vezes é até boa, dependendo de como a pessoa use. Droga sempre existiu e sempre vai existir, o que falta é o conhecimento…

Quais são seus projetos de futuro?

Vê se eu faço alguma coisa pela redução de danos. Tocar a associação de usuários. Voltar a participar da AMEA. […] Estudar mais redução de danos. Ir mais a fundo. […] Tenho só três anos (de redutor).

Você sabe por que existe a Cracolândia? […] Por que os usuários gostam de se reunir ali? Sabe por quê? Porque entre eles ali não tem preconceito. Todos são iguais. Agora vá sair um usuário de crack dali e vá pra sociedade… É preconceito, discriminação. E eles querem usar. Mas aí é que tá, o redutor de danos tem que orientar um uso menos abusivo. É essa a função do redutor. Fazer com que o usuário tenha um uso menos abusivo pra saúde dele, entendeu?

PROJETO REDES: promovendo a integração intersetorial

 

O Projeto REDES é uma iniciativa da SENAD-MJ em parceria com a área técnica de saúde mental do Ministério da Saúde e com o Ministério do Desenvolvimento Social que visa promover a aproximação entre as políticas de saúde, prevenção, segurança, proteção e inclusão social.

 

A professora Tânia Maris Grigolo, doutora em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília (UnB), mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista em Saúde Mental Coletiva pela Universidade de Santa Maria (UFSM), é interlocutora do projeto e nos conta um pouco sobre ele.

“O Projeto iniciou em 2014 em 20 municípios, com uma metodologia problematizadora das realidades locais e de apoio técnico, oferecendo um articulador de rede intersetorial para cada município participante.

O objetivo é desenvolver metodologias de integração entre as políticas públicas dos municípios, através da constituição de fóruns de gestão compartilhada, de canais de diálogo, de lugares de encontro, entre os profissionais das diversas redes, para que debatam e avaliem permanentemente as formas de prevenção, promoção e cuidado à saúde, de inclusão e de exercício da cidadania das pessoas com problemas relacionados às drogas.

Dessa forma, o REDES tem promovido e fortalecido, com a mediação do articulador, lugares de encontro das redes intersetoriais, conseguindo fortalecer os atores locais, gestores e profissionais, que, juntos, conseguem enfrentar com maior resolutividade os obstáculos que enfrentam para a criação, qualificação e funcionamento das Redes de Cuidado e promoção de vida.

Além disso, em 2016 o REDES ampliará seu apoio de articulação intersetorial para mais 30 municípios e já está colhendo os frutos de um trabalho desafiador! Afinal, precisamos desenvolver tecnologias de cuidado em rede, pois todos estão aprendendo a atuar de forma integrada. A grande maioria dos municípios já possui muitos serviços, pontos de atenção, unidades de atendimento, mas ainda faz seu trabalho de forma isolada intra e intersetorialmente e de forma fragmentada. Os resultados demonstram que investir na qualificação e articulação dos trabalhadores e dos serviços quebra resistências e abre as portas do cuidado às pessoas que fazem uso problemáticos de drogas.

O projeto REDES também construiu, com os municípios participantes em 2015, uma ação específica para a população mais vulnerável ao uso de álcool e outras drogas: a população em situação de rua. O Projeto de Inserção vai apoiar a inclusão socioeconômica, o cuidado e a emancipação das pessoas mais expostas aos riscos psicossociais nos municípios que fazem parte do REDES.

Os Conselhos da Sociedade Civil têm também um papel muito importante para a integração das redes e nesse projeto, pois a participação da comunidade, de atores sociais que propõem e fiscalizam as ações governamentais, permite o surgimento de agentes de mudanças. Os Conselhos Municipais de Políticas sobre Drogas, por exemplo, estão se reestruturando em muitos municípios e estados,  adquirindo uma composição ampliada e democratizada. É um desafio que os conselhos incluam os usuários e familiares e passem a atuar como agentes de defesa dos seus direitos às melhores formas de prevenção, de cuidado e à cidadania de todos.

Equipe do NUTE conta a experiência na realização de Projetos de Intervenção

Durante a 6ª edição do CURSO PREVENÇÃO DOS PROBLEMAS RELACIONADOS AO USO DE DROGAS, os cursistas construíram, individual ou em grupos, um projeto de intervenção, apresentado no fim do Curso, que serviu como avaliação final. Ao todo foram entregues mais de cinco mil projetos.

O projeto foi construído levando em conta os conteúdos do Curso e a aplicação prática desses conhecimentos. Por meio de atividades realizadas em cada capítulo, os cursistas aprenderam a escolher uma problemática, delimitar um objetivo, estabelecer uma metodologia e métodos de avaliação e também descobrir formas de captação de recursos. A ideia dos projetos de intervenção foi capacitar os participantes para, ao final do Curso, estarem capacitados para construí-los e aplicá-los em suas comunidades.

A doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (PEN/UFSC), Patrícia Ilha, que participou da coordenação da equipe de mediação da aprendizagem (EMA), da 6ª edição do Curso, conta um pouco como foi a realização dos projetos de intervenção.

“Na 6ª edição, contamos com uma ferramenta de aprendizagem inédita: a realização de um Projeto de Intervenção, cujo objetivo era fazer com que os cursistas voltassem suas atividades para a realidade de suas comunidades, realizando um levantamento sobre os vários aspectos envolvidos nos problemas relacionados ao uso de drogas, principalmente no que se refere às potencialidades e fragilidades do território em questão. A partir desse levantamento de dados, os cursistas deveriam construir projetos bem fundamentados para prevenir ou intervir na problemática em questão, com o intuito de promover o bem-estar integral dos sujeitos que faziam parte dos territórios aos quais os cursistas pertenciam, levando em consideração aspectos de saúde, sociais e psicológicos. Podemos observar no gráfico abaixo os dados referentes a quantidade de projetos recebidos na 6ª edição.

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Alguns cursistas elaboraram seus projetos de forma individual, outros preferiram realizar essa atividade em grupo, reunindo-se de acordo com interesses temáticos comuns ou com a proximidade regional. Mesmo sendo um curso a distância, muitos acabaram encontrando-se para desenvolver um trabalho coletivo que tinha como finalidade colaborar para melhoria de suas comunidades.

Dentre essas propostas de trabalho, citamos três, que foram publicadas no ebook da edição anterior. A primeira é do cursista André Luiz Dantas da Cunha, de Jequié, na Bahia, que elaborou um projeto de promoção de saúde, com o intuito de identificar os danos causados pelo crack na cavidade oral e proporcionar uma melhoria na saúde bucal desses usuários, evitando perdas dentárias, cáries e outros problemas que poderiam afetar a saúde dessa população.

Outro interessante projeto foi o da Ana Paula Alvarenga, de Uberlândia, Minas Gerais. Construído sob a perspectiva da redução de danos, o projeto foi direcionado aos usuários que iriam cumprir ou estavam cumprindo alguma pena e/ou medida alternativa, em que o delito tenha sido uso ou comércio e outros atos relacionados a drogas (conforme disposto na Lei n.º 11.343/2006). Tal projeto delimitou como objetivos articular as diretrizes da Redução de Danos com as tecnologias de cuidado que afirmam a cidadania, os direitos humanos e o protagonismo dos usuários e reduzir a porcentagem de reentrada de usuários no judiciário por delitos da mesma natureza – temática pouco abordada e de extrema importância, principalmente no que se refere à nova política da SENAD.

No Rio Grande do Sul, na cidade de Gravataí, a cursista Juliana Gomes Fiorott elaborou um belo projeto de prevenção para ser desenvolvido com adolescentes em situação de risco, com o objetivo de estabelecer uma rede de apoio, na qual seria realizado um trabalho de prevenção do uso de drogas através de encontros organizados em forma de roda de conversa, fazendo com que os próprios adolescentes pesquisassem os tipos e efeitos de drogas, e, a partir disso, seriam feitas discussões referentes à temática de forma a ampliar a consciência dos menores atendidos em relação ao objeto de estudo, reduzindo as motivações que poderiam levá-los ao uso de drogas.

Os projetos apresentados foram os mais variados, e todos mostraram uma visão humana no cuidado com o próximo, levando em consideração a individualidade e as necessidades de cada região.

A atividade foi um grande desafio, enfrentado com sucesso, que visava o exercício da prática comunitária, levando os aprendizados além das telas do computador e da teoria.”

O Supremo Tribunal Federal e a votação sobre a descriminalização do uso de drogas no Brasil

Uma das questões mais pertinentes e atuais no Brasil e no mundo é a descriminalização do uso de drogas. Está em pauta no Supremo Tribunal Federal um julgamento que diz respeito à descriminalização das drogas para o uso próprio: trata-se do Recurso Extraordinário n. 635.659.

Para esclarecer um pouco a questão, a professora Fernanda Martins, mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina e professora do curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, escreve sobre o tema, apontando qual o real enfoque da questão. É possível ler o texto na íntegra abaixo.

“O combate às drogas e a política criminal que envolve tal temática estão sendo repensados mundialmente. De forma a acompanhar esse processo, o Brasil, atualmente, discute  no Supremo Tribunal Federal a descriminalização do uso de drogas, prevista pelo art. 28 da Lei de Tóxicos (Lei 11.343/06), através do Recurso Extraordinário n. 635.659/SP. O referido artigo determina que o uso pessoal de drogas ilícitas é considerado crime e prevê a aplicação de pena ao usuário.

No entanto, o direito penal brasileiro está delineado sob o marco de garantias constitucionais, e há o entendimento, por alguns juristas, de que criminalizar a(o) cidadã(o) por optar usar substâncias  proibidas é inconstitucional, por ferir princípios declarados pela Constituição Federal brasileira de 1988.

Apesar de várias manifestações proferidas pelo ministros nas últimas sessões sobre quais drogas podem ou não ser descriminalizadas, especificamente aqui a maconha, qual a quantidade seria considerada (ir)relevante para o direito brasileiro, entre outros pontos específicos trabalhados pelos ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin, o enfoque da questão não deve se perder. O que está em pauta no STF não é uma discussão acerca de quais drogas devem ser usadas ou não, mas sim sobre a inconstitucionalidade do art. 28 da lei 11.343/06.  

Reconhecer que proibir o uso de drogas ao cidadão é um ato de intervenção do Estado sobre a liberdade individual, ou seja, pensar sobre a inconstitucionalidade do art. 28 da lei 11.343/06, é o ponto central do que é pedido ao STF. Assim, apesar de alguns pontos bem abordados pelos ministros acima mencionados, dar enfoque à discussão da descriminalização da maconha, ou de outros entorpecentes, desvirtua o interesse do Recurso, o qual tem como intuito específico realizar uma análise constitucional sobre a possibilidade de o Estado poder realmente interferir numa conduta que não gera ofensa a bens jurídicos de terceiros ou da sociedade (princípio da ofensividade) e se ele pode ou não determinar sobre a vida privada dos cidadãos e cidadãs (princípio da intimidade e privacidade), conforme voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes.

Nesse sentido, o que se propõe, através dessas breves palavras, é chamar atenção ao que está acontecendo no Supremo Tribunal Federal no que se refere à discussão da descriminalização do uso de drogas. Apesar de haver um movimento jurídico, social e político no sentido de resguardar a liberdade de escolhas dos indivíduos e descriminalizar o uso de drogas, o STF, através de seus ministros, caminha na contramão ao perpetuar a desigualdade e a estigmatização dos usuários de drogas, mantendo uma política seletiva de qual usuário deve ser reconhecido como descriminalizado e qual não. E essa seleção nada mais é do que inconstitucional, a partir da premissa do princípio básico do Estado Democrático, que se chama isonomia.”